segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Algemas

Ela consentiu aquela algema, com um sorriso nos lábios e uma lágrima dançando no canto dos olhos. Afinal de contas, mesmo feliz, ela não deixava de ser uma grande chorona. Logo saiu mostrando o seu presente para todo mundo, até que uma amiga mais libertina a alertou para o real significado daquilo: isso é para te prender o tempo todo. Ela bem que gostou da ideia.

Olhar para o braço se tornou gesto repetido de lembrança e carinho, com as três estrelas reluzindo seu símbolo preferido. E ela ria muito quando se lembrava das palavras da amiga.

Sem querer, ela não sabia mais onde havia guardado o símbolo do amor que foi construído cuidadosamente, mesmo depois de revirar toda a casa; tinha náuseas de desespero. Entre lágrimas (como deixá-las de lado, hein?), confessou seu medo.

E descobriu que o Amor sobrevive às algemas.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Banalogias Atropeladas

Não precisa ser muito esperto para perceber que eu falo desmedidamente, com alegorias próprias de gestual e tudo o mais. E, mesmo não tendo sempre muita paciência para desfiar o meu rosário, além de gostar de escrever em pílulas, eu sou predominantemente tagarela.

Deve ser por isso que eu não vejo graça nenhuma no Twitter. Pode ser que eu precise dele um dia, mas eu tenho quase certeza de que não vou conseguir me expressar em 140 caracteres.

*

Eu estou gostando taaanto do Maradona em baixa...vingança é um prato que se come frio, e para isso que existem sobremesas geladas e deliciosas.

Em boa hora para levantar a nossa moral no pré-Copa.

*

Li nesses dias uma pesquisa sobre blogs (e cometi a burrice de não salvá-la em lugar algum): ela falava da curtíssima duração de boa parte deles (6 meses já é longevidade).

Mas o que eu acho mesmo é que deveria haver uma pesquisa sobre conteúdo: alguém se esqueceu de desligar a torneirinha de asneiras da Emília! Gente sem originalidade, que escreve pelo puro e simples prazer de encher a boca para dizer que também tem o seu espaço.

Encontrar um bom blog tem sido boa surpresa.

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"Como é o lugar
quando ninguém passa por ele?
Existem as coisas
sem ser vistas?
(...)
Estrela não pensada,
palavra rascunhada no papel
que nunca ninguém leu?
Existe, existe o mundo
apenas pelo olhar
que o cria e lhe confere
espacialidade?"

(A Suposta Existência, Carlos Drummond de Andrade; trecho)

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

E agora está de bem...

A couraça vinha presente, junto com um monte defesas ensaiadíssimas para qualquer circunstância desgradável. "Você diz isso porque não imagina..." O salto alto era metafórico, e o lápis de olho foi deixado de lado para evitar constrangimentos. Orgulho, orgulho, orgulho. Mesmo que ela soubesse que aquele orgulho ia ser pisoteado, ela precisava dele para se proteger, pelo menos antes do desenrolar das coisas.

Quando ela escutou a voz subindo as escadas, não sabia se o que ela queria era sumir, chorar de medo ou dar uma gargalhada nervosa. Resolveu, em alguns segundos, não fazer nenhuma das três coisas; sorte a dela. Quando ele entrou, deu-lhe um abraço tão normal que ela ficou sem saber o que tinha feito com aqueles três anos de silêncio e lágrimas.

Ainda perplexa, correu para o outro lado do balcão da cozinha e fez qualquer coisa que ela sabia que ele ia gostar. Deu certo, a conversa passou a ter gosto de molho rosê, e ele gostou tanto que ela precisou fazer um pouco mais. Estranhamente, ele tinha entendido tudo, ela também. Sem os tais questionamentos para os quais ela tinha se preparado tanto, ela jogou a armadura fora junto com a embalagem do creme de leite.

Naquele dia, ela chegou em casa e se perguntou para onde ela tinha viajado, porque aquela situação sem turbulências e tanto assunto só podia ser resultante de um retorno de algum lugar. E, claro, chorou bastante por eles serem dois teimosos que não tinham comprado o bilhete de volta antes.

Depois disso, passou-se ao melhor de tudo: a redescoberta. O perfume misturado com cigarro era o mesmo, assim como o gosto musical. As histórias repetidas ganharam uma musicalidade nova. Ela se encontrou com ela mesma, aquela de dez, vinte anos atrás. E ela descobriu que eles, espantosa e geneticamente, ainda eram os mesmos de sempre.

Só um pouco menos orgulhosos.

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Que eu cansei da nossa fuga
Já não vejo motivos
Pra um amor de tantas rugas
Não ter o seu lugar
(Conversa de Botas Batidas, Los Hermanos)

sábado, 5 de setembro de 2009

No Canto dos Lábios

As circunstâncias tentam me afastar dele. Chuvas torrenciais bem na hora em que eu saio do supermercado sem sombrinha (e de blusa branca), ônibus perdidos por segundos, carregadores esquecidos, coisas importantíssimas perdidas.
Às vezes eu acho que o lado mau do mundo não o quer. Suas próprias manifestações podem afastá-lo em outros. Em excesso, faz mal. Tão querido em nós mesmos, e tão execrado em alguns dos outros.
Ah, mas pode fazer o que quiser...até sem sorrir, ele está sempre comigo. Ácido, suave, corrosivo, mórbido ou bobinho, nada me separa do meu humor.
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AMOR
Humor
(Oswald de Andrade)