domingo, 30 de novembro de 2008

Achocolatado

Todo mundo que esteve no pré vestibular já fez suas loucuras. Conheço gente que deixou o cabelo crescer por revolta, engordou horrores, vestia-se mal para ganhar tempo estudando...eu, com esse meu lado carola que não me abandona (ainda bem!), fiz uma promessa: se eu passasse no vestibular, a minha alegria seria tal que algum sacrifício não diminuiria em nada a minha satisfação e a minha gratidão a Deus por ter conseguido. Decidi que passaria o 1º período sem uma das minhas paixões: chocolate.

Pensei que seria um sacrifício desesperado. Passei o mês de julho comendo alguma coisa achocoladamente deliciosa diariamente. Fiz minha “despedida” com uma pizza de chocolate na véspera do início das aulas e pensei que viveria um tormento de abstinência, com direito a delirium tremens.

Foi aí que eu me enganei. Viver esses quase 4 meses sem chocolate abriu meus olhos (e apurou meu paladar) para coisas novas, que eu nunca tinha reparado. Como formiga inveterada que sou, acabei por substituir a minha privação por outros docinhos. Para isso, criatividade! Limão, maracujá, doce de leite, morango, leite condensado, coco...vários sabores novos surgiram na minha vida. Eu me senti como quem deixava a mesmice: inovando na culinária, eu fiquei alerta para outras mudanças que melhoraram a minha vida.

Não valia substituir o chocolate por um sabor semelhante (como o do Ovomaltine): isso seria subverter as regras do meu jogo, e eu sentiria o prazer do qual eu estava me privando. Não obstante, as pessoas me ofereciam o proibido o tempo todo, em suas mais variadas formas...é a Lei de Murphy: ninguém me ofereceria uma trufa de luxo se eu pudesse aceitá-la,tenho certeza. Tanta disciplina me atinou para todas aquelas coisas que eu sempre quis, mas sempre deixei para depois. E acabei por não adiá-las mais: entrei para a academia, melhorei minha alimentação, planejei melhor meus dias. Minha vida ficou estranhamente mais organizada.

Com o tempo, as pessoas começaram a se preocupar em não comer mais o bendito na minha frente. Aí ficou a última das lições: solidariedade, sempre que possível.

Bom, meu último compromisso com a faculdade nesse ano foi na sexta. Saí da prova de Constitucional e degustei um bom Suflair em comemoração (créditos à Paolla, que de tanto me oferecer chocolate, me deu um de presente!). E o que era para ser um tempo de sacrifício foi muito mais que isso: foi aprendizagem, crescimento. Sabe que, com tudo isso, nem senti tanta falta do dito cujo?

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Errata

A formatação do meu adorável poeminha de Drummond saiu erradíssima e incorrigível no último post. Portanto, aí vai ele novamente:

PASSAGEM DO ANO (trecho)

O último dia do ano
não é o último dia do tempo.
Outros dias virão
e novas coxas e ventres te comunicarão o calor da vida.
Beijarás bocas, rasgarás papéis,
farás viagens e tantas celebrações
de aniversário, formatura, promoção, glória, doce morte com sinfonia e coral,
que o tempo ficará repleto e não ouvirás o clamor,
os irreparáveis uivos
do lobo, na solidão.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Os Últimos Dias

Não vejo glamour algum no fim do ano. Chuva, caos, milhares de compromissos, amigos ocultos, ansiedades vãs, simbolismos esquecidos e a tentativa de parecer normal em meio a várias sacolas. Acho que todo mundo fica um pouco mais doido nos fins de ano.

No Brasil, das duas, uma: ou faz um calor dos infernos, com direito a chuvas de verão que estragam tudo e deixam as pessoas meio perdidas, ou faz um frio nublado atípico que provoca reclamações do tipo "assim não posso usar meu vestido novo". E tome criatividade e jogo de cintura para rebater as horas que parecem encolher nessa época.

Mesmo não gostando muito do Natal (acho penosamente triste e decadente, vai entender), eu sempre vejo o caos instalado como algo meio simbólico: antes de renascer para alguma coisa, temos a tendência de nos perder, de não saber o que fazer, parecendo baratas tontas. Depois, um tempo de quietude: a tal "semana de ressaca" entre Natal e Reveillon. E, por último, a consumação da mudança: mais um ano deixado para trás.

Enfim, desejo a todos que não se percam num mar de compromissos e compras no final deste 2008, e que parem para pensar...

O último dia do ano

Não é o último dia do tempo.

Outros dias virão

E novas coxas e ventres te comunicarão o calor da vida.

Beijarás bocas, rasgarás papéis, farás viagens e tantas celebrações

de aniversário, formatura, promoção,glória, doce morte com sinfonia e coral,

que o tempo ficará repleto e não ouvirás o clamor,

os irreparáveis uivos

do lobo, na solidão.

("Passagem do Ano",
Carlos Drummond de Andrade)

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Coletivos

Eu tenho mania de observar as pessoas no ônibus. Aquele ato rotineiro de usar a condução pode revelar muito sobre as pessoas...mas, às vezes, eu me decepciono um bocado com a maneira que elas podem ser ardilosas. Isso aconteceu nessa semana, por duas vezes.

Na primeira situação, eram umas 7h da manhã e eu reparei que uma mulher (particularmente, bem feia) conversava intimamente com o trocador, provavelmente pensando que ninguém reparava. Ela ria dele, e os dois combinavam alguma coisa para o fim de semana. Num olhar de relance, reparei a aliança brilhando na mão esquerda dele: para ele, aquilo parecia indiferente, assim como a mulher risonha na frente dele. Ela falava sobre a mulher dele de um jeito vulgar “você pensa que eu nunca fui até a sua casa? Eu sei como ela é, a Ana”...o mais curioso é que as duas tinham o mesmo nome, e a cada vez que ela dava uma gargalhada, eu tinha a impressão de que o cara a desprezava um pouco mais.

Desci do ônibus pensando nas duas Anas, e senti pena de ambas. Da primeira pela vida escondida do marido, pelos dias em que ela esperou por ele e ele não apareceu, pela desconfiança que deve viver semeada nela. Da segunda pela sua sensação falsa de ser amada, pela sua alegria infantil que faz com que ela perca a sua juventude com alguém que só a quer pelo gosto do proibido, pelo seu amor-próprio cego que não a deixou perceber o desprezo do amante, também apaixonado por ele mesmo.

Passados uns dois dias, eu descia da Universidade quando uma menina sentou na minha direção. Ela chorava copiosamente, e me deu uma curiosidade absurda de perguntá-la o que estava acontecendo, se eu podia ajudar, sabe-se lá. No ponto seguinte, subiu uma mulher, que parecia ser alguma tia dela, pela semelhança física. Quando ela viu a menina, sentou-se ao lado dela, perguntou o que estava havendo. Ela tinha sido dispensada pelo noivo. Ao invés de ajudá-la ou consolá-la, a mulher falou um caminhão de asneiras, aos gritos. Pelo que eu consegui entender, ela achava que a garota precisava se casar com o cara pelo dinheiro que ele tinha, e nem se importava com o fato de ele nem gostar mais dela. O importante era o golpe do baú, e, por isso, achava a sobrinha uma incompetente, com todas as letras bem gritadas.

Desci do ônibus antes do ponto.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Calos de Escrever

Adoro letra cursiva porque me parece particular, revelador, quase romântico (a minha, pelo menos, é cheia de voltas e “firulas”). Deve ser por isso que eu gosto de cartas e cartões manuscritos. Ainda que eu me renda às tecnologias do mundo e escreva muito pelo computador (por pura comodidade), eu fico com olhos brilhando quando escrevo à caneta ou recebo alguma coisa marcada pela letra de quem eu gosto.

Quem me lê sempre já pôde perceber que eu sou meio antiquada para várias coisas, e a preferência pela escrita à tinta é só mais uma delas. Talvez seja porque, desde criança, eu seja apaixonada pela letra do meu avô, que mais parece daquelas de convite de casamento, tombadinha para a frente, cerimoniosa. A da minha mãe é pequena e esparramada, como a voz de alguém que fala baixo. A do meu tio é ininteligível, como a timidez de quem quer passar despercebido. Tive um namorado que tinha uma letra tão grande quanto seu ego. Enfim, acredito em exames grafológicos, sem medo de enganos.

Quase sempre escrevo os textos do blog em folhas soltas de caderno. As idéias parecem fluir melhor...escrevo na velocidade do pensamento, rabiscando todo o papel, fazendo mil setinhas e rasuras, trocando a ordem dos parágrafos: no fim, é uma bagunça que só eu entendo, mas fica personalíssimo. E eu adoro olhar p aquela folha e encontrar minha letra cobrindo-a toda –pode soar idiota, mas passa uma sensação de produtividade muito curiosa.

Escrevi tudo isso (à mão, é claro) para relatar o prazer redescoberto de escrever cartas, sem motivo aparente. E tão ridículas quanto as que Fernando Pessoa desdenhou, mas admitiu o ridículo de quem não as escreve...

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Ainda comem criancinhas?

OK, esse é mais um dos textos que resisti muito para fazer. Até esse momento tentei escapar de política – e ideologia – assim como o diabo foge da cruz, mas não deu – isso me persegue.

Sim, sou uma cidadã que gosta conversar e debater assuntos relacionados a esses temas – apesar de ter andado sem paciência. Por isso resolvi escrever baseada em muitas coisas que li – nas últimas semanas – em blogs, colunas e revistas. Preciso dizer que alguns desses pontos me parecem para lá de démodé, mas “c’est la vie”.

O mundo me surpreende. A começar pelos discursos batidos que as pessoas têm a mania de repetir achando que estão falando uma grande novidade. Ontem passei pela coluna do Zeca Camargo no G1. O espaço tem a intenção de discutir e tratar de assuntos relacionados à arte e cultura, e faz isso bem. Gosto das opiniões e dos textos, apesar de não concordar com todos. Voltando ao assunto, a última polêmica foi o post sobre o filme do Che.

Na minha opinião, o texto não tem nada de político ou tendencioso como alguns acusaram. O que está escrito ali é sobre o filme, e as qualidades do mesmo e nada mais. Mas como falar de Che é sinônimo de causar discussão, nesse caso não foi diferente. Vários comentários dizendo que era um absurdo o jornalista descrever o “monstro” como herói. Para variar um pouco, começaram a enxurrada de argumentos previsíveis que estamos cansados de conhecer.

Tudo bem, o Ernesto Guevara de la Serna não era perfeito, matou pessoas e por ai vai. Mas espera, o cara não estava em uma guerrilha? Então quem está contra você é seu inimigo né? Ah... e se estamos lutando um contra o outro – com armas – a lógica é de matar ou morrer não é mesmo? Só para constar.

Outra coisa, não vale comparar o Guevara com o Hitler, por alguns motivos. Primeiro no caso do Hitler os “inimigos” diretos – judeus, ciganos etc – estavam em desvantagem óbvia. Não estavam militarizados, eram cidadãos comuns que seguiam as leis – até as “censuras” absurdas estabelecidas pelo chanceler – e outra, não estavam oprimindo e nem exigindo a subserviência de ninguém, muito menos do governo. O que não era o caso de Cuba, que passava pelos desmandos da ditadura do Fulgêncio Baptista.

O que me surpreende um bocado é essa obsessão e o medo que as pessoas ainda tem do “comunismo”. Acho que tem gente que ainda acredita que os comunistas comem criancinhas – nem a minha avó acreditaria nisso hoje. Sinceramente estamos vivendo outro período.

Período este em que o novo presidente americano é negro, democrata e jovem, e, já disse que acredita ser o momento de restabelecer as relações diplomáticas entre o país e a ilha – Cuba. Esse mesmo homem recebeu elogios de Fidel e Chávez – o que era até então impensado.

Acho que não é mais o momento de escolher e inventar os “inimigos” do mundo. Estamos passando por uma fase de mudanças. Espero que sejam benéficas.

P.S.: A Intenção do texto não é desrespeitar a opinião alheia, e sim esclarecer alguns equívocos correntes.

P.S.2: Escrevi o texto escutando “Soy loco por ti América” com Caetano.

P.S.3: A eleição americana é papo para outro texto.




terça-feira, 4 de novembro de 2008

Perdidos na Selva

Feriado do Servidor Público e resolvemos fazer alguma coisa diferente. Nisso alguém teve a brilhante idéia de fazermos um programa de índio clássico: passar o feriado na fazenda da família do Gustavo, desligados do mundo. E lá fomos nós, eu, Gustavo e um casal de amigos.

Chegamos no domingo, dia do 2º turno das eleições em Juiz de Fora. E aí começou meu drama: eu queria avisar minha mãe que estava tudo bem comigo e NENHUM celular do grupo pegava, num raio de quilômetros. Mandei um recado para ela por uma pessoa que ia para a cidade e fiquei menos preocupada com a preocupação dela.

Enquanto era dia, quase tudo foi ótimo. Sol, céu azul, calor, banho de mangueira e um bocado de risos. Mas a noite foi chegando e as coisas começaram a mudar.

Primeiro ponto: eu não suporto saber que as coisas estão acontecendo sem o meu conhecimento. Somada à preocupação se minha mãe já sabia que as coisas corriam bem, eu fiquei plantada na frente da TV e não consegui descobrir quem era o novo prefeito de Juiz de Fora.

Além disso, vários insetos não-catalogados começaram a aparecer. Eu mato as baratas da minha casa porque elas são pequenas, mas aqueles artrópodes silvestres tinham um quê a mais de ferocidade: maiores, barulhentos, com asas e sem a menor cerimônia, partiam para cima de mim (será que eles sentem o cheiro do medo feito os cachorros?). Com a minha primeira gritaria, eles foram apelidados carinhosamente pelos meus amigos de “dragões de Komodo” (preciso dizer que o escândalo era proporcional?).

No segundo dia, os meninos faziam um churrasco quando um camundongo (ou um rato, um preá, sabe-se lá) apareceu. O bicho era aparentemente inofensivo, subiu na pá que eles estenderam para joga-lo longe, uma coisinha nojentamente dócil. Mas daí a eles dizerem que o invasor era “bonitinho”? Foi demais para mim...

Bem, tirando esses fatores avessos ao meu jeito urbanóide de ser, o saldo foi muito positivo e o feriado foi bastante divertido. Mas eu juro que, da próxima vez, eu levo um spray inseticida (além do repelente)!

domingo, 2 de novembro de 2008

Mesmo que Acabe

Algumas coisas vivem em nós como uma cicatriz: por mais que seja feia ou dolorida, ajudou a moldar aquilo que somos no presente. Essas marcas vivem na alma como algo que pode ser esquecido no cotidiano: mas, a qualquer momento, quando você pensa que elas sumiram, lá vem uma dorzinha chata, como aquelas que afligem as cicatrizes físicas na mudança de tempo (quem nunca ouviu falar de um joelho que dói quando vai chover?).
Já foi dito aqui, pela Maria, que o problema que todos queremos nos sentir indispensáveis. E que lutem por nós, mesmo que desprezemos essa luta. Que nos queiram, mesmo que não queiramos. Que, se não nos amam, que nos odeiem de um ódio profundo e lento. Mas não é bem assim que as coisas funcionam. A intimidade, quando cessa, dá lugar (geralmente) a um conhecimento vago que se dissipa no tempo, até que aquela se torne mais uma história, das que se conta nas rodas de bar: "uma vez eu briguei com uma amiga..." ou "eu tive um namorado que...". Para a gente, é melhor assim, mas sempre existe um desejo secreto que faz com que desejemos que seja pior para o outro, e que, de preferência, ele sofra muito.
Porque, na verdade, somos todos um pouco cruéis. Porém, desumanidades à parte (ou isso seria humanidade em demasia?), tocamos a vida como quem prefere que as coisas sejam realmente assim, e todos seriam felizes para sempre sem as lembranças infelizes, que vêm como uma onda inesperada, numa terça de sol, com uma música qualquer, uma gíria esquecida ou uma notícia desavisada.
O bom disso tudo é que assim podemos lembrar das coisas que fizemos de errado, das neuroses superadas com auto-disciplina massacrante, das dores pretéritas. E é só assim que podemos evoluir, com quelóides que nenhuma cirurgia pode remover.