quinta-feira, 31 de julho de 2008

Conexões

No domingo de Carnaval eu acordei cedo e fui à missa. Estava chovendo, fazia um tempinho miserável e tudo que eu queria (durante todo aquele carnaval) era me esconder, dormir, e só acordar depois que o tempo já tivesse passado e o resultado do vestibular já tivesse saído. Eu estava pálida pela ansiedade, e não conseguia vestir nada mais alegre que uma roupa preta. Mas a buzina na porta da minha casa e o sorriso por trás do vidro embaçado pela chuva me fizeram entender que eu simplesmente ia encontrar alguma razão bacana e edificante para ir àquela missa.

Chegando lá, éramos eu, o sorriso, e mais meia dúzia de pessoas dentro da igreja. Quando o padre começou o sermão, eu entendi o porquê de estar lá, e justo com aquela companhia. O assunto era afinidade.

Ele dizia que a gente não pode escolher com quem tem afinidade, que aquele era um sentimento que nos era dado de presente sem maiores explicações; justamente a falta de nexo nessas ligações é que trazia toda a graça. Que os verdadeiros amigos não precisavam de motivos para sê-lo: basta a conexão simples que faz com que o assunto flua naturalmente e a risada aconteça (ou até mesmo o choro, em momentos menos agradáveis). A cumplicidade real nasce da gratuidade.

A afinidade abre espaço para o afeto, e o afeto se apresenta naquelas situações nas quais não se consegue explicar a razão pela qual você faz alguma coisa por aquele outro, mas faz. Ele nem é seu parente, mas você não precisa fazer nada em especial na companhia dele. Você não deve nada a ele, mas sente a necessidade de mandar notícias sempre que possível, e receber respostas. Sem necessidade de satisfações, a família "sanguínea" cresce e ganha um agregado. Nesse dia, saímos da missa e fomos para a minha casa, conversar algum assunto inventado na hora.

Nesses dias tensos, esse sorriso (suave ou debochado) dissipou minha ansiedade, me carregou para o carnaval em Rio Preto, velou pela minha insônia e comemorou comigo quando tudo aconteceu do jeito certo. Quando as coisas ficam nebulosas, é esse ouvido que me ouve. Quando acontece algo bom, é o telefone dela que toca. De vez em sempre, eu agradeço por esse "presente", tão afinado com o meu pensamento. Amiga é pouco para essa irmã que se sacrifica junto comigo, sem nem perguntar o porquê.

***
"É aquele que entende seu desejo de voar, de sumir devagar, a angústia pela compreensão dos acontecimentos, a sede pelo 'por vir'. É ao mesmo tempo espelho que te reflete, e óleo derramado sobre suas águas agitadas(...)"

Um comentário:

Anônimo disse...

De manhã vai à missa, de noite pro carnaval de Rio Preto! "Como ir do céu ao inferno em dez passos simples", por Stela Tannure!
uahuhauahuhauhuah

Mto bonito o texto! Gostei!